O chapéu e a cabeça.

Hoje o Estadão publica matéria, onde tenta mostrar José Antônio Dias Toffoli como um jovem talento, desde a sua infância até os seus anos de universitário. Uma das passagens é assim descrita:

"Engaja-se ao XI de Agosto, centro acadêmico de resistências, e dele torna-se diretor. Por esses tempos, 1988, aparece por lá um gaúcho de bigodes, prestigiado especialista em Direito Constitucional. Chama-se Paulo Brossard de Souza Pinto, ministro da Justiça do governo José Sarney. Sua marca é o chapéu, do qual não se separa por nada nesse mundo. Mas, num descuido da ilustre visita, que fora almoçar e dar palestra, alguém lhe surrupia o adereço.Toffoli percorre o pátio e as escadarias centenárias com o chapéu do doutor Brossard, ora na cabeça, ora girando-o na ponta do indicador. Anda com a peça para cima e para baixo, a ela dá a importância de troféu. Consta que, afinal, o chapéu serviria para quitar algumas dívidas do XI. O ministro nem fez queixa."

Aos 95 anos, Paulo Brossard de Souza Pinto é um dos mais brilhantes juristas brasileiros e foi um dos maiores nomes da política nacional, desde 1954, quando elegeu-se deputado estadual pelo Partido Libertador do Rio Grande do Sul. Considerado um dos grandes especialistas em Direito Constitucional, foi senador, candidato à vice-presidente na chapa do general Euler Bentes, ministro da Justiça, presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal, último cargo exercido em sua luminosa trajetória. Lá chegou com o seu chapéu, os seus livros, a sua palavra e mais de 60 anos. Sua biografia é impressionante, assim como o seu notório saber jurídico e a sua ilibada conduta nos momentos mais cruciais da recente história do país. Atualmente, Paulo Brossard vem escrevendo artigos. Um dos seus últimos textos, aborda a soma de poderes exagerada em mãos do presidente. O título é "Ninguém pode sempre!". Vale à pena ler.

Podemos afirmar que a indicação de Toffoli é fruto do que Brossard aborda no artigo acima indicado, referindo-se à Lula.

Aliás, a exigência vitoriosa do presidente não deixa de ser burlesca, pois segundo o art. 2º da Constituição, “São poderes da União, independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”; embora independentes, o presidente da República impõe ao Senado determinada orientação e, ainda à custa de lágrimas e ranger de dentes, a colheu como queria. O presidente, que não pode interferir em eleição do mais modesto município, à luz do sol, escolheu sua sucessora e abençoada, passa a ostentar o título de princesa herdeira, reconhecida e proclamada.

Brossard escreveu o artigo menos de trinta dias atrás, antes do episódio da indicação de Toffoli para o STF.O fato, se conhecido, teria um lugar de destaque no texto. O que podemos dizer, neste momento tão lamentável e deplorável da democracia brasileira? Pelo menos que, na falta de maior brilho na sua biografia, o mais novo ministro do Supremo Tribunal Federal poderá vangloriar-se de um dia ter tido contato com uma das cabeças mais brilhantes do Direito. Pena que não foi como aluno ou subordinado, pena que foi, dentro das melhores tradições petistas, roubando o chapéu de Paulo Brossard de Souza Pinto.