Esta lâmina, do power point do Ministro da Maquiagem, Fernando Pimentel, quando apresentou a caótica balança comercial do país, havia chamado atenção. Como não sou economista, não consegui fazer o raciocínio rápido e completo. Mas não me saía da cabeça ver o Brasil perdendo posições justamente nos mercados mais competitivos e aumentando suas vendas em países que vivem uma profunda crise, como Argentina, Venezuela e até mesmo Cuba. Vejam na tabela, marcado em vermelho, onde as nossas vendas caíram. E vejam, acima, onde elas aumentaram. Desconsiderem a China. A participação chinesa não é em produtos industrializados. Eles importam commodities do agro e da mineração. Hoje, ao ler o artigo de Rolf Kuntz no Estadão, caiu a ficha. Estamos vendendo manufaturados apenas para paisecos, pois a nossa indústria não tem mais competitividade, seja por falta de tecnologia, seja pela falta de acordos comerciais, seja pelo tremendo custo que o PT impõe sobre a mesma na carga tributária e na legislação trabalhista. Mas o maior problema é político. É a defesa do terceiro-mundismo fantasiado de multilateralismo que afunda o Brasil. Abaixo, o artigo assustador.
O pior saldo comercial em 13 anos - o pitoresco e discutível
superávit de US$ 2,56 bilhões - está longe de ser um desastre isolado.
Os números da balança retratam com precisão a crise brasileira: uma
indústria com enorme dificuldade para competir, o descompasso entre
consumo e produção, a política econômica feita de remendos e
improvisações e a dependência cada vez maior de uns poucos setores ainda
eficientes, com destaque para o agronegócio e a mineração. O menos
importante, nesta altura, é apontar a exportação fictícia de plataformas
de petróleo, no valor de US$ 7,74 bilhões, como evidente maquiagem dos
números. Muito mais instrutivos, nesta altura, são outros detalhes. Uma
dissecção da balança comercial, mesmo sumária, dá uma boa ideia dos
estragos acumulados na economia em dez anos, especialmente nos últimos
seis ou sete.
Sem os US$ 7,74 bilhões das plataformas, a exportação de
manufaturados fica reduzida a US$ 85,35 bilhões. Para igualar as
condições convém fazer a mesma operação com os números de 2012.
Eliminada a plataforma de US$ 1,46 bilhão, a receita desse conjunto cai
para US$ 89,25 bilhões. Sem essa depuração, o valor dos manufaturados
cresceu 1,81% de um ano para o outro, pela média dos dias úteis. Com a
depuração, o movimento entre os dois anos é uma assustadora queda de
5,13%.
Alguns dos itens com recuo de vendas de um ano para o outro: óleos
combustíveis, aviões, autopeças, veículos de carga, motores e partes
para veículos e motores e geradores elétricos. No caso dos aviões, a
redução de US$ 4,75 bilhões para US$ 3,83 bilhões pode estar relacionada
com oscilações normais no ritmo das encomendas e da produção. Mas o
cenário geral da indústria é muito ruim. No caso dos semimanufaturados, a
diminuição, também calculada pela média dos dias úteis, chegou a 8,3%.
Não há como atribuir esse resultado à crise internacional, até porque
várias economias desenvolvidas, a começar pela americana, avançaram na
recuperação, Para a América Latina e o Caribe, grandes compradores de
manufaturados brasileiros, as vendas totais aumentaram 5,6%. Mesmo para a
Argentina as exportações cresceram 8,1%, apesar do protecionismo.
O problema no comércio com os mercados desenvolvidos está associado
principalmente ao baixo poder de competição da indústria, ou da sua
maior parte, e às melhores condições de acesso de produtores de outros
países. Mas essa é uma questão política. O governo brasileiro rejeitou
em 2003 um acordo interamericano com participação dos Estados Unidos.
Com isso deixou espaço a vários países concorrentes. No caso da União
Europeia, o grande problema tem sido o governo argentino. É o principal
entrave à conclusão do acordo comercial em negociação desde os anos
1990.
O Mercosul, promissor na fase inicial, tornou-se um trambolho com a
conversão prematura em união aduaneira. Os quatro sócios originais nunca
chegaram sequer a implantar uma eficiente zona de livre-comércio. Mas
foram adiante, assumiram o compromisso mal planejado da Tarifa Externa
Comum e aceitaram as limitações daí decorrentes. Nenhum deles pode,
sozinho, concluir acordos ambiciosos de liberalização comercial com
parceiros estranhos ao bloco.
De vez em quando alguém sugere, no Brasil, o abandono da união
aduaneira e o retorno à condição de livre-comércio. Poderia ser um
recomeço muito saudável, mas o governo brasileiro nem admite a discussão
da ideia. A fantasia de uma liderança regional - obviamente associada
ao terceiro-mundismo em vigor a partir de 2003 - tem sido um entrave
ainda mais danoso que as amarras da fracassada união aduaneira.
Em 2013 o pior efeito da crise global, para o Brasil, foi a redução
dos preços de commodities. Apesar disso, o comércio do agronegócio foi
muito bem. Até novembro, o setor exportou US$ 93,58 bilhões de
matérias-primas e produtos elaborados e acumulou um superávit de US$
77,88 bilhões. O saldo final deve ter superado US$ 80 bilhões, valor
anulado com muita folga pelo déficit da maior parte da indústria.
Em dezembro, só as vendas de milho em grão, carnes bovina e de
frango, farelo e óleo de soja, café em grão, açúcar em bruto e celulose
renderam US$ 3,87 bilhões. O quadro especial do setor, com valores
discriminados e reorganizados, aparecerá, como sempre, no site do
Ministério da Agricultura. Os números serão os do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, mas a arrumação seguirá
um critério diferenciado.
No caso do agronegócio, o poder de competição reflete os ganhos de
produtividade acumulados em três décadas, além da manutenção, nos
últimos anos, de um razoável volume de investimentos setoriais, como as
compras de caminhões e máquinas em 2013. A eficiência tem sido
suficiente para compensar, mas só em parte, as desvantagens logísticas.
Quando um setor respeitado internacionalmente mal consegue embarcar
seus produtos, é quase uma piada insistir na conversa do câmbio como
grande problema da economia nacional. Mas a piada convém a um governo
com graves dificuldades para formular e executar uma política de
investimentos públicos e privados.
Ainda no capítulo do humor, um lembrete sobre as exportações
fictícias de plataformas: o expediente foi realmente criado em 1999 para
proporcionar benefícios fiscais à atividade petrolífera. Até o ministro
da Fazenda, Guido Mantega, citou esse fato em entrevista. Mas essas
operações nunca foram usadas tão amplamente quanto no último ano. Em
2012, esse item rendeu US$ 1,46 bilhão à contabilidade comercial. Em
2013, US$ 7,76 bilhões, com aumento de 426,4% pela média diária.
Apareceu no topo da lista de manufaturados, acima de automóveis, aviões e
autopeças. Mas nem isso disfarçou os problemas de uma indústria
enfraquecida por anos de incompetência e irresponsabilidade na política
econômica.
10 comentários
Rolf Kuntz indo direto ao ponto:
Reply"Quando um setor respeitado internacionalmente mal consegue embarcar seus produtos, é quase uma piada insistir na conversa do câmbio como grande problema da economia nacional. Mas a piada convém a um governo com graves dificuldades para formular e executar uma política de investimentos públicos e privados."
A agricultura brasileira evoluiu por ser um setor menos protegido e mais competitivo. Já a indústria funciona na mão inversa. A reserva de mercado na informática fez o Brasil perder tempo precioso; a exigência de conteúdo nacional mínimo em tantos segmentos também não ajuda. São todas iniciativas protecionistas que fecham a economia ao mundo e refreiam os ganhos de produtividade. As montadoras de automóveis recebem subsídios desde que se instalaram no Brasil, nos anos 1950, e até hoje fabricam alguns dos carros mais caros do planeta. O pior é que esse protecionismo acabou fazendo com que os investimentos se concentrassem nas rodovias, também as mais caras e menos eficazes.
Resultado: produzimos milho e soja mais baratos que os americanos, só que, quando o carregamento chega ao porto, a vantagem já se perdeu. O objetivo de um país não deve ser o de enriquecer alguns poucos empresários, mas a sociedade como um todo.