O custo da farra(3)

Como o governo deveria reagir a esse problema?
Se eu fosse o presidente Lula, eu me mudaria para Washington para tentar atrair dólares do Tesouro americano ou de instituições multilaterais – o Banco Mundial e, quem sabe, até o Fundo Monetário Internacional – a fim de garantir que o ajuste do déficit externo não seja tão drástico. O drama é exatamente este: o sistema financeiro privado dos países ricos não vai poder ser fonte de financiamento exatamente porque é nele que a crise está enraizada. O governo americano, portanto, tornou-se praticamente a única fonte disponível de dólares.
Como, se o coração da crise está exatamente nos Estados Unidos?
Não podemos nos esquecer de que, por serem os emissores do dólar, a moeda de curso internacional, o dinheiro mais aceito no mundo, os Estados Unidos recebem uma enxurrada de recursos de todo o planeta. Verifica-se agora uma versão ainda mais acentuada da chamada flight to safety (fuga para a segurança), comportamento esperado em qualquer turbulência. Posso fazer um paralelo com a crise do petróleo na década de 70. Naquela ocasião, o dinheiro estava com os países árabes. Eles depositavam os dólares adicionais que recebiam nos bancos americanos, e estes faziam a reciclagem para países co-mo o Brasil, importadores de petróleo. Agora, os dólares estão sobrando não nos bancos, mas no governo americano. Só ele poderá fazer essa reciclagem.
Uma vez passada a fase mais crítica, os ventos não podem voltar a inflar as velas do Brasil?
Não na mesma intensidade. Esqueça. O setor bancário mundial está encolhendo. É o que se chama de desalavancagem. Os bancos internacionais emprestavam, em média, doze vezes o total de seus depósitos. A alavancagem era de doze, portanto. Estima-se que vá recuar para oito. A conclusão é que vai diminuir o fluxo de dólares na economia global. As grandes empresas brasileiras, que estão profundamente inseridas no mercado mundial, sentirão esse efeito. Para completar, houve redução no preço das matérias-primas (commodities) exportadas pelo Brasil, o que enxugou ainda mais a oferta interna de dólares. Por isso, não resta dúvida de que esse novo mundo será pior do que o anterior, o que exigirá um ajuste nas contas do governo.